sábado, 3 de setembro de 2011

A CAPOEIRA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

A capoeira é um dos conteúdos mais significativos da Educação Física escolar e é um de nossos prediletos. Em determinado momento do ano passado, fazíamos um curso de formação em capoeira e educação física pela Secretaria de Estado de Educação do Paraná, no qual uma tarefa solicitada seria resenhar algum texto sobre essa manifestação popular. Socializaremos abaixo o conteúdo desta tarefa em que indicamos a leitura de um importante texto nessa temática.

O texto ao qual pretendemos nos debruçar brevemente nessa tarefa é um de nossos preferidos na discussão da inserção da capoeira enquanto conteúdo da educação física escolar. Escrito por José Luiz Cirqueira Falcão, conhecido no mundo da capoeiragem como Mestre Falcão, graduado em Educação Física, mestre e doutor em Educação, onde em seu último nível de especialização contou com a orientação da professora Celi Nelza Zulke Taffarel, uma das autoras da obra Metodologia de Ensino da Educação Física (1992). Autor de vários artigos e livros como, por exemplo, “A Escolarização da Capoeira” (1996), Mestre Falcão é considerado uma das primeiras referências na temática da capoeira e Educação Física no Brasil hoje.

Nesse texto, "Unidade Didática 2: Capoeira", o autor objetiva tematizar a capoeira na escola dentro de uma perspectiva crítica, sintonizada com o projeto político-pedagógico de transformação social materializado pela instituição escolar. Essa unidade, segundo Falcão (1998) reflete o utópico interesse de construir uma ressignificação do sentido da capoeira, pois esta, além de veicular conteúdo ideológico, vem incorporando-se, sistematicamente, à lógica da mercadorização e da esportivização.

São três tópicos principais no texto, as considerações didáticas, onde o autor apresenta centralmente uma seqüência adotada como estratégia de ensino, as categorias da capoeira, onde aspectos fundamentais da capoeira são conceituados, e por fim, sugere algumas situações de ensino, debruçando-se segundo sua forma de ensino, nas categorias identificadas anteriormente como significativas a capoeira.

Nas considerações didáticas, Falcão parte da concepção de Eleonor Kunz (1994) e apresenta alguns desdobramentos no ensino da Educação Física na escola. Essa estratégia apresenta quatro momentos. 1) Encenação: exercitação de jogos consagrados ou não na capoeiragem, possibilitando vivências sócio-emocionais de forma comunicativa. 2) Problematização: confronto e discussão das diversas situações de ensino levadas a efeitos pela encenação. 3) Ampliação: levantamento de dificuldades nas ações, apresentação pelo professor e alunos de subsídios que ampliem a visão em relação à temática vivenciada. 4) Reconstrução Coletiva do Conhecimento: consiste na ressignificação do sentido do conhecimento abordado a partir das discussões coletivas das etapas anteriores.

Sobre as categorias da capoeira, o autor desenvolve conceitos a partir destas últimas, as quais ele considera significativas. São eles: 1) Ludicidade: elemento preponderante na capoeira, remonta seu surgimento, quando essa era observada sendo praticada em momentos de não-trabalho. 2) Jogo-luta-dança: tríade geral da capoeira, onde o jogo a luta e a dança de interpenetram, misturam-se. 3) Referencial Afro-Brasileiro: referência originária da capoeira, muito distinta dos demais referenciais consagradas na Educação Física escolar através dos esportes, em sua maioria norte-americanos ou europeus. 4) Reatualização Histórica: onde a história da capoeira deve propiciar a leitura crítica da realidade atual.

Em relação às situações de ensino, Falcão sugere segundo os passos estratégicos de sua forma de ensinar citados anteriormente, uma maneira de trabalhar com fundamentos básicos da capoeira, qual sejam, a ginga, os golpes, os cânticos, a instrumentação e a roda de capoeira.

Por fim, o autor discute brevemente a questão da avaliação, como um dos grandes desafios da educação em geral. E ainda sugere um Festival Pedagógico de Encerramento das atividades, onde os alunos possam socializar as experiências acumuladas no decorrer do período letivo.

O texto de Falcão é uma das sugestões de encaminhamento para o trabalho com a capoeira na Educação Física escolar mais significativas que conhecemos. Apresenta uma possibilidade de trabalho crítico com essa manifestação cultural, extrapolando limites históricos dessa área, comumente confundida com a instituição esportiva. É também referência significativa por apresentar aprofundamento teórico geral e específico sobre o mundo da capoeiragem, configurando-se em linguagem clara e objetiva, os aspectos da inserção desse conteúdo no contexto escolar.

6 comentários:

blogdosergiomoura disse...

Onde o texto está disponível?

blogdosergiomoura disse...

Onde podemos acessar o texto indicado?

EFISICACRITICA disse...

Salve professor Sergio! Obrigado pela visita e comentário. A referência para o texto indicado é a seguinte: FALCÃO, José Luiz Cirqueira. Unidade didática 2: capoeira. In: Elenor Kunz. (Org.). Didática da Educação Física 1. 1 ed. Ijuí: Unijuí, 1998, v. 1, p. 55-94.

Unknown disse...

Nilo,
Sei que este não é o foco do texto que estão discutindo, mas em diálogo com alguns colegas da àrea estavamos verificando que em relação ao conteúdo de lutas a Educação Física, "em algumas práticas" prioriza ou ainda "apenas" esta luta e/ou jogos de oposição. Dessa forma estávamos resgatando outras lutas orientais, como Judô, Sumô, Karatê, Kendo, etc. Além de lutas como boxe, esgrima e etc. O que nos remeteu a outro debate, em relação a diferença entre lutas e artes marciais, teria indicações a respeito deste debate?
Obrigado e parabéns pela iniciativa de socializar esses saberes!

EFISICACRITICA disse...

Salve Rafael, obrigado pela visita e pelo comentário. Também compreendo que não é esse o foco do texto, mas se ele enseja um debate sobre os conteúdos, penso que devemos aproveitar. Tenho acordo que são mais recorrentes os trabalhos sobre capoeira e jogos de oposição e louvo vossa iniciativa de resgate da tradição oriental.

Eu não tenho leitura direta de algum autor que realize o debate conceitural entre lutas versus artes marciais, mas conheço um texto sobre o judô na educação física escolar que faz algumas citações a respeito:

"Assim como Carvalho (2007) entendemos que o Judô não é uma Arte Marcial, e seria
incoerente com a filosofia preconizada no Judô, classificá-lo como se sendo uma luta para a
guerra. Pois a guerra é luta entre antagônicos que se repelem, e o Judô é a luta entre os
contrários que formam uma unidade".

"Aqui seguimos a perspectiva de Yoshikawa apud Carvalho (2007, p.65) que faz menção ao
Judô em relação ao conceito de Arte Marcial: “fazer alusão ao judô enquanto ‘arte marcial’ ou
enquanto ‘arte para a guerra’ é desconhecer que o deus da guerra dos japoneses era ‘Yamiya-
Hachiman’”. Carvalho (2007, p.65) ainda defende a ideia de que o termo mais adequado seria
Artes Hachimanianas ou Arte Nipônica, este último termo entendido por nós como mais amplo
que o primeiro, já que se refere a toda Luta apropriada em determinada região e não segundo a
uma finalidade".

"Alertamos que não consideramos o Judô como uma Arte Marcial, pautando-nos em Carvalho
(2007, p. 53) que afirma que: “a rigor, o judô não foi erigido como ‘arma’ de ataque, ‘arma’ para
a guerra, mas como meio à construção de uma vida equilibrada ancorada na honra, na lealdade,
na fidelidade aos princípios e na solidariedade aos camaradas”.

Acho que dá uma ajuda. Para ter acesso ao texto integral (uma dissertação de mestrado) podes clicar aqui: http://boletimef.org/biblioteca/2871.

Um abraço!

Anônimo disse...

Sou Professor de Educação Física, formado pela Faculdade Dom Bosco em 2007, passei no Concurso Público no mesmo ano, e desde então sou Professor (PSS) Processo Seletivo Simplificado, e Mestre de Capoeira. Prático desde os 08 anos de idade, hoje 42 anos.
E sempre lecionei divulgando a capoeira infantil, e nunca fui chamado para dar uma palestra ou curso aos profissionais da área.
Ou seja, a anos lutamos para colocar a capoeira dentro das escolas e ainda assim temos pouco apoio. Mas a luta continua...
Hoje atualmente a Capoeira na Escola Municipal Jardim Europa é muita valorizada, uma escola super bacana com uma direção espetacular que permite trabalhar de forma transparente. Os alunos(as) adoram a Capoeira Infantil e as aulas de Educação Física, pelo fato novo de terem aulas diferenciadas.